Parashat Ki Tissá - Dançando de modo erótico com o Bezerro de Ouro

Neste estudo, o rabino Dr. David Ben-Gad HaCohen (da Hebrew university), reflete sobre o peso da decisão de Moshe, de quebrar as tábuas. Foi a idolatria praticada que motivou aquilo ou, teve algo a mais?

Quando Moshe desce da montanha depois de receber as tábuas contendo o decálogo, ele testemunha os israelitas celebrando um festival com o bezerro de ouro. Testemunhando isso, Moshe joga as tábuas e as quebra (Shemot 32:19). Mas por que Moshe quebra as tábuas neste momento? Mais cedo, antes de começar sua descida do topo da montanha, HaShem o informou do pecado dos israelitas (Shemot 32:8); Por que ele não quebrou as tábuas naquele momento? Esta questão tem sido explorada por uma série de comentários tradicionais. O rabino Ben-Gad HaCohen sugere uma nova abordagem que se baseia em contexto histórico e descobertas arqueológicas.

De acordo com Shemot 32:8, Moshe é dito por HaShem:

(ח) סָ֣רוּ מַהֵ֗ר מִן־הַדֶּ֙רֶךְ֙ אֲשֶׁ֣ר צִוִּיתִ֔ם עָשׂ֣וּ לָהֶ֔ם עֵ֖גֶל מַסֵּכָ֑ה וַיִּשְׁתַּֽחֲווּ־לוֹ֙ וַיִּזְבְּחוּ־ל֔וֹ וַיֹּ֣אמְר֔וּ אֵ֤לֶּה אֱלֹהֶ֙יךָ֙ יִשְׂרָאֵ֔ל אֲשֶׁ֥ר הֶֽעֱל֖וּךָ מֵאֶ֥רֶץ מִצְרָֽיִם׃

"Eles fizeram-se um bezerro derretido e curvaram-se a isso, e sacrificaram a ele, dizendo: 'Este é o seu Elohim, Ó Israel, que te tirou da terra do Egito!"

Quando Moshe vê o acampamento, no entanto, ele vê algo mais (Shemot 32: 19):

(יט) וַֽיְהִ֗י כַּאֲשֶׁ֤ר קָרַב֙ אֶל־הַֽמַּחֲנֶ֔ה וַיַּ֥רְא אֶת־הָעֵ֖גֶל וּמְחֹלֹ֑ת וַיִּֽחַר־אַ֣ף מֹשֶׁ֗ה וַיַּשְׁלֵ֤ךְ מִיָּדָו֙ אֶת־הַלֻּחֹ֔ת וַיְשַׁבֵּ֥ר אֹתָ֖ם תַּ֥חַת הָהָֽר׃

"Assim que Moshe chegou perto do acampamento e viu o bezerro e a dança - ele ficou enfurecido; e ele arremessou as tábuas de suas mãos e quebrou ao pé da montanha.

O verso acrescenta a frase "e a dança" à informação que Moshe já conhecia (o culto ao bezerro), e foi só quando se aproximou do acampamento e testemunhou aquilo - só então, - ele quebra as tábuas.

O Significado da Dança

O que há de tão errado em dançar, ou mais especificamente, por que era pior do que "apenas" cultuar o bezerro, a ponto de justificar ser mencionado?

A terminologia usada no texto de Shemot 32 implica que os israelitas estavam envolvidos na promiscuidade sexual em grupo.

O texto de Shemot 32:6 observa: "O texto de Shemot 32:6 observa: "eles subiram para brincar (לצחק)".

O termo "brincar" tem claros tons sexuais, como vemos no Sefer Bereshit 26: 8, onde Avimele'h vê Itzhak "O termo "brincar" tem claros tons sexuais, como vemos no Sefer Bereshit 26: 8, onde Avimele'h vê Itzhak "brincando" com sua esposa, Rifka, e deduz que eles deveriam ser marido e mulher.

Em suma, no verso 19, Moshe descobre sobre a natureza erótica do partido, algo que HaShem não o havia informado anteriormente.

[William H. C. Propp, Exodus 19-40 (Anchor Bible; NY: Doubleday, 2006), 563, que cita o comentário do Rashi a Shemot 32.6]

Notando isso em combinação com a reação de Moshe à dança, o rabino Shimshon Rafael Hirsch sugere que a dança erótica incitou Moshe a destruir as tábuas (Shemot 32: 19).

(יט) וַֽיְהִ֗י כַּאֲשֶׁ֤ר קָרַב֙ אֶל־הַֽמַּחֲנֶ֔ה וַיַּ֥רְא אֶת־הָעֵ֖גֶל וּמְחֹלֹ֑ת וַיִּֽחַר־אַ֣ף מֹשֶׁ֗ה וַיַּשְׁלֵ֤ךְ מִיָּדָו֙ אֶת־הַלֻּחֹ֔ת וַיְשַׁבֵּ֥ר אֹתָ֖ם תַּ֥חַת הָהָֽר׃
(19) As soon as Moses came near the camp and saw the calf and the dancing, he became enraged; and he hurled the tablets from his hands and shattered them at the foot of the mountain.

"את העגל ומחֹלֹת" (שמ' לב:יט). את "העגל" המיודע שכבר ידע עליו, "ומחֹלֹת" בלתי ידועים, כי נתחדשו עתה לעיניו, והן מחולות אורגיאסטיות של פריצות, והם שהביאו אותו לשבּר את הלוחות. לא רק טעייה תיאולוגית מצא בישראל, אלא גם שחיתות של פריצות שנתלוותה אליה.

O bezerro e a dança – "o bezerro" aparece com o artigo definitivo, porque ele já sabia sobre ele; e o termo "dançando" sem o artigo definitivo, já que ele não sabia sobre isso, pois ele só aprendeu sobre isso vendo com seus próprios olhos. Eram danças [em meio a] orgias e obscenidades.

Testemunhar foi o que levou Moshe a quebrar as tábuas, posto que aquele momento, não foi apenas um colapso teológico dos israelitas, mas um colapso da ética relacionada aos costumes sexuais que faziam parte da tradição, especialmente, “não tornar público, aquilo que deve ser privado”, o conceito de Tzini’ut ou Recato/Modéstia.

A concepção seria a de que, no antigo contexto do Antigo Oriente Próximo, haveria essa disputa de concepções, que pode então ajudar os leitores modernos a entender melhor, a reação de Moshe.

Dança Ritual e o acasalamento divino: Contexto Antigo do Oriente Próximo

Figuras de dançarinos, cantores e músicos decoram incensários de Kena'an e regiões próximas. Arqueólogos encontraram estatuetas de dançarinos e músicos entre os restos de vários templos. O melhor exemplo de tal reunião, vem do santuário edomita em Horvat Qitmit no Vale de Arad.

[Itzhaq Beit-Aryeh, Horvat Qitmit: An Edomite Shrine in the Biblical Negev (Tel Aviv University Press, 1995).]

Os que prestavam tal culto em Qitmit faziam seu rito, a uma divindade feminina – sua cabeça, adornada com três chifres, encontrada por arqueólogos no Templo.

Embora as danças estivessem associadas a muitos deuses (mesmo ao HaShem, como se lê em Shemot 15: 20) e templos…

[Colin Renfrew, The Archaeology of Cult (Athens, 1985), 19-20]

...exemplos como o de Qitmit apontam para a associação particularmente forte entre rituais de dança e divindades específicamente femininas.

Se dançar apontava para uma divindade feminina, então adicioná-la ao bezerro, que era um símbolo que já desempenhava um papel em nossa história, trazia à mente o conceito do culto do casal principal do panteão de Kena’an: El e sua esposa Asherá.

O culto de Asherá

Embora seja verdade que pode não ter havido ritos de culto sexual (ou, prostituição ritual institucionalizada) dentro do território já dominado de Israel, como foi argumentado recentemente por Edward Lipiński; Temos que observar, como ele mesmo documenta, as evidências textuais e arqueológicas, da prática da prostituição e sexo ritual em Kena'an, bem como ao redor do Mediterrâneo.

[Edward Lipiński, ‘Cult Prostitution in ancient Israel?’, Biblical Archaeology Review 40 (January/February 2014): 48-56, 70]

A sugestão é que a história dos israelitas dançando no Monte Sinai descreva uma adoração ao estilo pagão/Kena’ani de El e Asherá – o rito de sexualidade dos deuses.

Os israelitas, de acordo com nossa narrativa, associaram o bezerro a divindade, e disseram que era aquela, ‘que os tirou da terra do Egito’ (32:8).

Essa associação não é surpresa alguma.

O termo associado ao divino, <El> = > = Força, era associado, dentre outras coisas, ao touro, até mesmo por escritores bíblicos, do Reino do Norte (exemplo: Bamidbar 24: 8; Tehilim 68: 35b).

Combinando as duas imagens textuais: a do bezerro e a da dança; parece provável que a Torá estivesse descrevendo um ritual onde o tal ‘casal divino’, El (representado pelo bezerro) e Asherá (esposa de El, representada por mulheres fantasiadas), estivessem sendo cultuados juntos, começando pela dança ritual e prosseguindo para vias de fato...

Olhar para a arqueologia ao refletir na cena dramática do Sinai, fortalece consideravelmente essa tese.

Na opinião do rabino Dr. David Ben-Gad HaCohen, o melhor candidato para a localização da ‘montanha do HaShem’, sobre a qual a história da revelação do Sinai se baseia, seria o local hoje chamado de Guebel Hashm et-Tarif.

Esta montanha fica a nordeste da Península do Sinai, cerca de 22 quilômetros a oeste da fronteira de Netafim perto de Eilat.

Esta é a única montanha que se encaixa em todos os dados geográficos escondidos nos versos, mencionando a ‘montanha de HaShem’, seja quando chama de Sinai ou de Horev.

Ela fica a oeste da antiga região de Midian, (Shemot 3:1), numa estrada reta que liga Midian ao Egito (Shemot 4:20, 27), ao lado de um cruzamento, com uma antiga estrada indo em direção à terra de Kena'an (19:29-30).

E seriam cerca de 11 dias caminhando até Kadesh-barnea (Devarim 1:2).

[M.P. Malone and R.B. Roeder, Montana: A history of Two Centuries, Seattle – London: University of Washington, 1976, pp. 112–113]

O mais importante é que mais de uma dúzia de templos de bronze estão situados no pé daquela montanha, indicando que Guebel Hashem et-Tarif era conhecida pelos moradores do deserto como uma montanha considerada sagrada (Shemot 18:5).

A maioria desses templos eram templos gêmeos.

[Uzi Avner, “Ancient Cult Sites in the Negev and Sinai Deserts,” Tel Aviv 11 (1984), 115–131 – 119-122]

O edifício à esquerda de cada par continha uma área de sacrifícios, enquanto o templo à direita tinha um círculo de pedras em seu centro, que provavelmente abrigava a árvore considerada sagrada. Uzi Avner, que descobriu os templos gêmeos, sugeriu que El e Asherá eram adorados lá.

Parece que já no terceiro milênio antes da era comum, Guebel Hashm et-Tarif era conhecida como "a montanha do HaShem". Se os israelitas adoraram El e Asherá na montanha de HaShem, então é muito provável mesmo que a dança não fosse apenas uma dança inocente, mas sim uma dança erótica, parte de rituais de fertilidade. E isso explicaria muito bem, a enorme irritação de Moshe.

[Embora Asherá fosse geralmente entendida como esposa de El, havia outras deusas também em Kena'an / Israel, dentre as mais famosas, Anat e Astarte. Anat, geralmente uma deusa guerreira, também era associada à fertilidade e também tinha cultos sexuais. Astarte foi sincretizada pelos escritores gregos com Afrodite, a deusa do amor, por razões parecidas. Veja: Anchor Bible Dictionary, vol. 1, pág. 493. Curiosamente, o pesquisador Nicholas Wyatt argumentou que na realidade, de fato, existem poucas ou nenhuma evidência de que Astarte, seria tratada como uma deusa da fertilidade. Por causa disso, ele a interpreta principalmente como uma deusa da guerra.

Para saber mais sobre a possibilidade de prostituição em culto em Israel, consulte: Anchor Bible Dictionary, vol. 5, pp. 507-509.]

A questão não era apenas idolatria, no sentido de colocar fé em divindades estrangeiras. Envolvia também, o rito idólatra mais atrativos, como os rituais de fertilidade, que representavam a degradação moral e ética, e o colapso da sociedade israelita que se pretendia construir. Essa compreensão, teria feito Moshe quebrar as tábuas.

Segurando as Tábuas e a Luta de Moshe

Ao contar a narrativa do bezerro de ouro, o escritor do Sefer Devarim apresentou Moshe, adicionando um pouco de cenas extras, à descrição do que havia ocorrido (Devarim 9:17):

(יז) וָאֶתְפֹּשׂ֙ בִּשְׁנֵ֣י הַלֻּחֹ֔ת וָֽאַשְׁלִכֵ֔ם מֵעַ֖ל שְׁתֵּ֣י יָדָ֑י וָאֲשַׁבְּרֵ֖ם לְעֵינֵיכֶֽם׃

Depois agarrei as duas tábuas e joguei-as com as duas mãos, esmagando-as diante de seus olhos.

Se Moshe já estava segurando as tábuas, que sentido faz para ele dizer que as agarrou?

Pois é. Este problema foi notado pelo místico, o rabino Haim ben Atar, que ofereceu uma solução inventiva e criativa.

ואתפש בשני וגו'. צריך לדעת למה הוצרך לתופשם והלא בידו היו. ואולי כשלא חטאו ישראל היו הלוחות גבוהות על יד משה ולא היתה ידו משגת לקחת אותם, וכמו שדקדק לומר בפסוק שלפני זה ושני הלוחות על שתי ידי ולא אמר בשתי ידי או בידי, אלא נתכוון לומר שלא היו בידיו ממש אלא גבוהות למעלה מידיו והיו נושאות עצמן, ואחר שראה העגל הוסר כח קדושתם והוצרך לתופשם בידו.

Comentando o verso [E eu agarrei ] – é preciso entender por que ele precisava agarrá-las. Elas já não estavam nas mãos dele? Talvez, antes de Israel pecar, as tábuas estivessem flutuando sobre Moshe, e ele não poderia alcançá-las para pegar. Isso pode ser o que o verso anterior implica, "e as duas tábuas estavam em minhas duas mãos." Ele não disse "nas minhas duas mãos" ou "nas minhas mãos". Em vez disso, ele quis expressar que elas não estavam realmente em suas mãos, mas sim flutuando acima de suas mãos. Depois que ele viu o bezerro, o poder sagrado das [tábuas] as deixou, e ele foi forçado a agarrá-las em suas mãos.

A cena mágica e fantástica, inventada pelo rabino Ben Atar, de tábuas flutuantes perdendo seu poder mágico, é inspirada por uma abordagem tomada pelos Sábios em seus Midrashim.

Por exemplo, o Talmud Ierushalmi (tratado de Ta'anit 4:5) oferece mais de uma abordagem Midrashica, para explicar a cena de Moshe, agarrando as tábuas com as mãos, como parte de sua explicação geral para por que Moshe as quebrou.

רבי שמואל בר נחמן בשם רבי יונתן הלוחות היו אורכן ששה טפחים ורחבן שלש' והיה משה תפוש בטפחיים והקב"ה בטפחיים וטפחיי' ריוח באמצע כיון שעשו ישראל אותו מעשה ביקש הקדוש ברוך הוא לחוטפן מידו של משה וגברה ידו של משה וחטפן ממנו הוא שהכתוב משבחו בסוף ואומר ולכל היד החזקה ייא שלמא על ידא דגברת עליה מינא

O rabino Shmuel bar Nah'man [disse] em nome do rabino Ionatan: "As tábuas tinham 6 ‘tefahim’ de largura e três de altura. Moshe agarrou a um tefa’h [da tábua], e o Santo, aos dois Tefahim [do outro lado], e havia dois tefahim [de espaço] no meio. Uma vez que Israel fez o que fez, o Santo tentou levá-la para longe de Moshe, mas Moshe foi mais forte e tirou [as tábuas] das [mãos do] HaShem. Este é o sentido do louvor bíblico no final da Torá, "e todo o seu braço forte" – que haja paz sobre ele - cujo braço foi mais forte que o meu."

רבי יוחנן בשם רבי יוסה בר אביי הלוחות היו מבקשין לפרוח והיה משה תופשן דכתיב ואתפוש בשני הלוחות

O rabino Iohanan [disse] em nome do rabino Iossa bar Abáie: [Foram] "as tábuas [que] voavam para longe, mas Moshe as agarrou, como se diz, 'e eu agarrei as duas tábuas.'

[Há ainda, outra interpretação também nesta mesma fonte: “Foi ensinado em nome do rabino Nehemiah: [Foi] 'o próprio texto [que] voou'. O rabino Azariah [disse] em nome do rabino Iehudá, da casa do rabino Shimon: 'As tábuas pesavam quarenta ‘sea’h’ (8.5 litros), mas o texto as sustentava. Uma vez que o texto voou, eles se tornaram muito pesadas para Moshe, e [por isso] caíram e se despedaçaram.

תני בשם רבי נחמיה הכתב עצמו פרח רבי עזרה בשם רבי יהודה בי רבי סימון הלוחות היו משאוי ארבעים סאה והכתב היה סובלן כיון שפרח הכתב כבדו על ידיו של משה ונפלו ונשתברו.

Como essa interpretação realmente não lida com o termo <tafas>, nem aborda qualquer luta entre Moshe e a divindade, deixamos o tema para outros estudos...]

A interpretação final, que sugere que a perda do texto foi o que tornou as tábuas muito mais pesadas, não lida com a questão do manejo delas. Nas duas primeiras interpretações, no entanto, Moshe agarra as tábuas para evitar que elas retornassem aos céus – como se fosse - seja por conta própria ou pelas próprias mãos de HaShem, pegando de volta. Moshe queria mantê-las ele mesmo, a fim de destruí-las.

Os sábios entendem a raiz "agarrar" (ת.פ.ש) como um termo que conotaria luta, conflito. Eles não ilustraram no texto uma luta interna, mas uma luta real, a cena em que Moshe realmente lutaria com o HaShem. Esta representação dramática ilustra a natureza drástica da ação de Moshe.

Moshe destrói as tábuas da aliança escritas pelas próprias mãos de HaShem e dadas a ele. Como ele teve a ousadia de tomar essa decisão? Ele tinha alguma dúvida sobre sua atitude?

Embora a Torá - em um nível <peshat> (simples) - nunca faça alusão a qualquer conflito interno por parte de Moshe, é difícil ler a história e não imaginar Moshe afetado por conflitos internos. Por um lado, Moshe estava testemunhando uma queda profunda da ética e um abandono dos princípios básicos do Caminho do HaShem. Um abandono da decência mínima, do respeito ao espaço público e ao outro ser humano, da degradação da sexualidade por meio da exposição pública.

Por outro lado, o HaShem lhe deu as tábuas e nunca ordenou que ele as destruísse. O HaShem nem mencionou a questão da dança erótica, que foi o que o chateou tanto, embora a “pena capital” mencionada depois no texto, deixa claro que a idolatria foi considerada em sentido pleno.

Qualquer que tenha sido o conflito interno, no texto em si, temos poucas evidência disso. O Moshe encontrado pelo leitor no texto, nem hesita. E apesar do fato de que o HaShem não faz menção à dança erótica, e nunca dá permissão clara a Moshe para destruir as tábuas em texto, Moshe age por sua própria iniciativa e sua ação não é negada. Incapaz de ficar só olhando, Moshe entra em cena, e quebra as tábuas diante dos olhos dos israelitas.

Louvor dos Sábios

A decisão de Moshe foi justificada? Ele fez a coisa certa?

Os Sábios vão com tudo para elogiar a decisão de Moshe. O livro de Devarim termina com grande louvor a Moshe por causa disso (34:10-12):

י וְלֹא קָם נָבִיא עוֹד בְּיִשְׂרָאֵל כְּמֹשֶׁה אֲשֶׁר יְדָעוֹ יְהוָה פָּנִים אֶל פָּנִים. יא לְכָל הָאֹתוֹת וְהַמּוֹפְתִים אֲשֶׁר שְׁלָחוֹ יְהוָה לַעֲשׂוֹת בְּאֶרֶץ מִצְרָיִם לְפַרְעֹה וּלְכָל עֲבָדָיו וּלְכָל אַרְצוֹ. יב וּלְכֹל הַיָּד הַחֲזָקָה וּלְכֹל הַמּוֹרָא הַגָּדוֹל אֲשֶׁר עָשָׂה מֹשֶׁה לְעֵינֵי כָּל יִשְׂרָאֵל.

Nunca mais surgiu em Israel um profeta como Moshe - a quem HaShem falou, face a face, com relação aos vários sinais e maravilhas, que o HaShem o enviou para exibir na terra do Egito, contra o faraó e todos os seus cortesãos e todo o seu país, e pelo braço forte e grande feitos, que Moshe exibiu diante dos olhos de todos os israelitas.

Já vimos antes que, na passagem do Talmud Ierushalmi, o rabino Shmuel bar Nah'man diz, em nome do rabino Ionatan, que entendia o louvor no verso 12, sobre o braço forte, como um elogio de HaShem a Moshe por “derrotá-lo” – como se fosse - na disputa pelas tábuas.

O Rashi, fazendo uso de um Midrash do período dos Tana’im, e lidando de modo ligeiramente diferente dos ganchos hermenêuticos, oferece uma interpretação parecida:

ולכל היד החזקה – שקבל את התורה בלוחות בידיו:

ולכל המורא הגדול – נסים וגבורות שבמדבר הגדול והנורא:

לעיני כל ישראל – שנשאו לבו לשבור הלוחות לעיניהם, שנאמר (לעיל ט, יז) ואשברם לעיניכם, והסכימה דעת הקדוש ברוך הוא לדעתו, שנאמר (שמות לד, א) אשר שברת, יישר כחך ששברת:

'Todo o braço forte' – isso se refere à Torá, que ele recebeu com a força de seus braços.

"Toda a grande maravilha" – os sinais e atos poderosos realizados no grande e maravilhoso deserto.

"Diante dos olhos de todos Israel" – que seu coração o levantou para quebrar as tábuas diante de seus olhos, como se diz (Devarim 9:17), 'e eu os quebrei diante de seus olhos.' O Santo concordou com sua decisão, como se diz (Shemot 9: 17), '[as primeiras tábuas], que você quebrou', ou seja, "bom trabalho, que você quebrou".

Embora Moshe tenha agido sem a autoridade de HaShem indicada no texto, e talvez por isso, até mesmo em conflito direto com a autoridade Divina, os sábios apoiaram a atitude, e até glorificaram sua decisão ousada de destruir as tábuas.

Conclusão

Apesar das tábuas serem chamadas de “obra de HaShem”, e conterem a mensagem de HaShem aos israelitas, Moshe as destrói, sem sequer pedir a permissão de HaShem! É neste ponto que a idolatria é rejeitada!

Ainda mais marcante que isso, Moshe destrói as tábuas, não em reação apenas a idolatria de um modo geral (ele sabia sobre o bezerro muito antes de voltar ao campo), mas por causa da natureza erótica do ritual feito, que testemunhou, negando todos os princípios éticos da Torá.

Ao destruir as tábuas em reação à dança erótica ritual, Moshe volta os holofotes sobre a moral degradada reinando no acampamento, e não apenas contra a violação ritual de prestar culto ao casal divino, ou de se criar um bezerro, inventando uma nova religião.

Esta mensagem foi importante o suficiente para que os sábios colocassem sua aprovação a atitude de Moshe, no verso final da própria Torá.