O eclipse lunar mais longo do século

Nas primeiras horas da manhã de sexta-feira, 19 de novembro de 2021, houve outro eclipse lunar parcial.

Eclipses assim, não são considerados raros. Mas este seria especial porque teria sido o eclipse lunar mais longo do século, durando um total de quase três horas e meia.

Também seria quase tão espetacular visualmente, quanto um eclipse lunar total, pois no seu pico a lua será 97% eclipsada, como se diz.

QUEM VIU O ECLIPSE?

O eclipse lunar seria parcialmente visível da América do Norte e do Sul, Austrália, Nova Zelândia e partes da Europa e Ásia.

Mas, infelizmente, não foi visível de Israel.

O desafio para muitos, porém, seria acordar para ver o fenômeno, considerando que os céus de suas cidades permitissem isso.

O início foi na sexta-feira de manhã à 3:02 no Brasil, atingindo sua máxima às 6:02, e terminando 9:03.

POR QUE VEMOS UM ECLIPSE

Um eclipse solar só pode ocorrer no início de um mês hebraico, à medida que a lua fica entre o Sol e a Terra.

Um eclipse lunar também está ligado ao mês judaico, e só pode ocorrer por volta do 15º dia do mês, quando a lua está cheia. À medida que a Terra passa entre o Sol e a Lua, sua sombra é lançada sobre a lua, resultando em um eclipse. Aliás a sombra da terra na lua "comprova" (por A + B) seu real formato...

Então por que não vemos um eclipse lunar todo mês?

A resposta é simples. A órbita da lua está inclinada a 5 graus entre o sol e a terra, de modo que a cada mês a lua pode estar ligeiramente acima, ou ligeiramente abaixo desse ponto de vista. E um eclipse lunar só ocorrerá quando os três corpos (Sol, Terra e Lua) se alinharem no mesmo ponto de visão, a partir da órbita da Terra, posição chamada de eclíptica.

O TALMUD FALANDO DE ECLIPSES

תלמוד בבלי סוכה דף כט עמוד א

תנו רבנן: בזמן שהחמה לוקה - סימן רע לעובדי כוכבים, לבנה לוקה - סימן רע לשונאיהם של ישראל, מפני שישראל מונין ללבנה ועובדי כוכבים לחמה...

תנו רבנן: בשביל ארבעה דברים חמה לוקה: על אב בית דין שמת ואינו נספד כהלכה, ועל נערה המאורסה שצעקה בעיר ואין מושיע לה, ועל משכב זכור, ועל שני אחין שנשפך דמן כאחד

A propósito do fato de que a chuva em Sucot seria uma indicação de repreensão divina, a Guemará cita vários tópicos relacionados a isso: Os Sábios ensinaram: Quando o sol é eclipsado é um mau presságio para o mundo inteiro. A Guemará conta uma parábola: Ao que este assunto é comparável? A um rei de carne e osso que preparou um banquete para seus servos e colocou uma lanterna [panas] diante deles para iluminar o salão. Ele ficou zangado com eles e disse ao seu servo: Peguem a lanterna de diante deles e os deixe na escuridão...

Os Sábios ensinaram que por causa de quatro questões, o sol seria eclipsado: Por causa de um presidente do tribunal que morre e não é lamentado de forma adequada, e o eclipse seria nesta ilustração, uma espécie de "lamento dos Céus"; por causa de uma jovem noiva que gritou na cidade que estava sendo estuprada e não houve ninguém para resgatá-la; por conta da homossexualidade; e por causa de dois irmãos, cujo sangue foi derramado como um...

Então é isso, o que temos - quatro causas de um eclipse solar. Note que nenhuma "causa" é dada para um eclipse lunar - somos apenas informados de que, era um "mau presságio para Israel". E como Rashi explica essa passagem? Ele diz:

"Não ouvi nenhuma explicação para isso". טעם

EXPLICAÇÕES JUDAICAS POSTERIORES DE UM ECLIPSE SOLAR

Se sabemos que eclipses são eventos celestiais regulares cujo tempo é previsível e preciso, como poderíamos entender o trecho citado do Talmud, no tratado de Sukah, que sugere que um eclipse era uma "reação divina" a certas condutas humanas?

Já vimos que Rashi não foi capaz de explicar a passagem, mas isso não impediu que outros tentassem.

O rabino conhecido como, o Maharal de Praga (1520-1609) apresentou uma longa explicação que você pode até ler aqui.

Resumindo, ele explica mais ou menos assim:

"Sim, um eclipse é um evento mecânico e previsível. Mas, na verdade, se não houvesse pecados, não haveriam eclipses, porque Deus teria projetado o universo de forma diferente, e em um universo livre de pecados... não haveria necessidade de projetar um eclipse...

Então o Maharal sugeriu que "num universo livre de pecados", a lua não orbitaria como agora, em um ângulo de 5 graus para o plano sol-terra...

Mas, neste caso, onde estaria a lua?

Não poderia estar no mesmo plano que o Sol e a Terra, desde que haveria um eclipse solar todos os meses!

Se estivesse tipo, a 20 graus acima do horizonte, ainda haveria eclipses solares e lunares, embora fossem mais raros...

A única maneira de realmente não haver eclipses solares (no universo imaginário do Maharal e seus discípulos...) seria a lua orbitar a Terra a 90 graus no eixo sol-terra.

Daí então, a lua nunca ficaria entre o sol e a terra, e nunca poderia haver um eclipse solar.

O problema disso, é que nunca haveria um Rosh Hodesh (um novo mês), e a lua sempre seria visível.

Melhor deixar como está....

יערות דבש דרוש י׳ב

Outra tentativa de explicar o Talmud, foi oferecida por Jonatan Eybeschutz (sim, aquele da polêmica de ser seguidor secreto de Shabatai Tzvi - para quem acompanha nossos estudos - 1690-1764).

Em 1751, Eybeschutz tinha sido eleito rabino-chefe das Três Comunidades (Altona, Hamburgo e Wandsbek), e falamos que, posteriormente ele foi acusado de ser um seguidor secreto do falso messias Shabatai Tzvi.

Pois, em janeiro de 1751, Eybeschutz deu uma drasha (uma palestra) em Hamburgo, na qual ele abordou o mesmo problema que o Maharal havia notado:

Se um eclipse solar era um evento previsível, como poderia estar relacionado à conduta humana, fosse qual fosse?

Sua resposta foi bem diferente:

O Talmud na Massehet de Sukah não estava realmente abordando o fenômeno, que chamamos de eclipse solar.

De acordo com Eybeschutz, a frase em Sukah "בזמן שהחמה לוקה" significaria - "quando há manchas solares".

Embora ele tenha sido criativo (como em geral, místicos são), sua resposta foi tão implausível e errônea, quanto a sugestão do Maharal!

Em primeiro lugar, manchas solares não poderiam ter sido "vistas" antes da invenção do telescópio. Ponto.

Elas foram descritas, pela primeira vez, em março de 1611 por um contemporâneo de Galileu, chamado Christopher Scheiner (embora Galileu não perdeu tempo em afirmar que tinha sido ele, não Scheiner, quem primeiro interpretou corretamente o que elas eram...)

Como manchas solares não podiam ter sido vistas a olho nu, não pode ter sido isso o que os rabinos na Guemará de Sukah estariam descrevendo.

Isso impediu místicos e fanáticos de mentirem, dizendo que "os rabinos antigos falavam de saberes da ciência naquela época"?

Claro que não....

Christopher Scheine, Rosa Ursina sive Sol (Bracciai 1626-1630)

Ainda segundo Eybeschutz, as tais "manchas solares" não teriam "causa conhecida" e, não teriam "período fixo" para sua aparição".

Eybeschutz era uma pessoa Mística, acreditava piamente nas crenças mágicas da cabalá, muito difundida em sua época. Isso torna sua "tentativa" de explicar, compreensível. Mas, quando ele tenta "elaborar", ele piora mais ainda a situação, pois mesmo pela ciência de sua época - seu raciocínio não estava correto.

Na verdade, tanto Scheiner quanto Galileu sabiam - e escreveram - que as manchas solares eram permanentes (pelo menos por um bom tempo) e se moviam lentamente através da face do sol. Ao contrário de Eybeschutz que reproduzia crenças místicas, Galileu e Scheiner se baseavam naquilo que era observado.

É interessante notar que Galileu ficou muito animado com a descoberta de que as manchas se moviam através da face do sol. Isso sugeriu (embora não tenha comprovado naquela época) que o sol, em si mesmo, estava girando.

Galileu também descobriu que Júpiter era orbitado por luas.

Ambas as descobertas naquele momento, adicionaram mais apoio ao chamado Modelo Copérnico, segundo o qual, a Terra estava girando em seu próprio eixo, e não era portanto, o centro de todo o movimento de corpos celestes no céu.

Mas, é claro que Eybeschutz não acreditava que Copérnico estava correto. Sobre os fatos que hoje sabemos ser verdade, o profundo estudioso de Cabalá disse:

"Copérnico e seus partidários fizeram papel de bobos, quando declaram que a Terra orbita [o Sol].

Eles nos deixaram com uma mentira, e a verdade vai testemunhar que a Terra está parada para sempre."

Eybeschutz queria fazer com que manchas solares explicassem um mistério talmúdico, mas ele descartou as evidências que estes fenômenos proporcionavam para outros assuntos - ou seja, que a Terra se move em torno de si mesma, e em torno do sol.

A REALIDADE É O BARÔMETRO DA VERDADE